30 março 2007

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Serra do Corvo Branco, Urubici, Santa Catarina. Foto de julho de 2005.

26 março 2007

O médico e a familia do paciente


Segmento do capítulo "O médico e a familia do paciente", publicado no livro Psiquiatria para estudantes de Medicina (referência ao final).

Andolfi (1996) afirma que "com a passagem para uma visão mais complexa das relações interpessoais, o modelo diádico não é mais suficiente, pois não dá conta do vasto sistema dentro do qual uma relação entre duas pessoas se desenvolve" (p. 30). Baseados nesta idéia, podemos dizer que a relação entre o médico e o paciente só pode ser observada e entendida se os contextos mais amplos em que ela ocorre forem levados em conta. Um deles é o serviço de saúde (hospital, ambulatório, clínica, consultório particular). Outro é família do paciente, com a qual se estabelece triangulação que pode ser definida pelos termos médico-paciente-família. De fato, dificilmente pode entender os processos de construção e manutenção da doença, sem levar em conta o contexto familiar do paciente. Da mesma forma, a família pode ser um contexto de cura, de potencialização de recursos terapêuticos (Cataldo e cols. [199?]; Soar Filho, 1998).

É desta unidade de observação que nos ocuparemos agora, discutindo as possíveis ressonânncias entre a história pessoal do médico e as histórias e configurações familiares de seus pacientes. O médico pode vir a ter uma relação tão intensa com a família do paciente (como nos casos de um politraumatismo grave com internação em UTI), e/ou tão prolongada (como nas enfermidades psiquiátricas e nas doenças crônicas em geral), que se pode afirmar que passa a formar, com ela, um sistema maior, que chamaremos, seguindo um modelo das terapias sistêmicas, de sistema terapêutico. Assim, ele fica sujeito a ser "absorvido" pelo sistema familiar, e a ocupar determinaadas funções que podem servir tanto à doença quanto à cura.



A história de vida do médico e, especialmente das relações com sua família de origem, pode ter uma grande influência sobre sua prática profisssional, tanto no sentido de prejudicar quanto de facilitar seu manejo de determinadas situações (daí a conveniência de que em algum momento de sua formação passe pela experiência de terapia pesssoal). Se o médico vivenciou, por exemplo, a morte de sua mãe por câncer, e na época sua família manteve segredo em torno do diagnóstico, não o revelando para "proteger" a mãe (geralmente o doente sabe de sua condição melhor que os familiares possam imaginar), ele pode vir a ter arreependimentos ou ressentimentos por não ter perrmitido que ela se preparasse para a morte, se despedisse devidamente da família, ou porque ele mesmo não lhe disse tudo o que gostaria de dizer. Tal situação pode, se não estiver devidamente elaborada, levá-lo a uma excessiva identificação com os familiares que passam por situações semelhanntes, gerando-lhe ansiedade e desconforto. Por outro lado, se tiver a oportunidade de aprender com sua vivência, poderá desenvolver uma maior empatia (capacidade de se colocar no lugar do outro), e sentir-se mais apto a ajudar as famílias de seus pacientes (Zimerman, 1992).

Pode ocorrer, também, que na família do paciente existam pessoas que lembram o médico de seus próprios parentes (e geralmente isto ocorre de forma inconsciente), como um pai autoritário, uma mãe depressiva, ou um irmão competitivo, gerando os sentimentos desagradáveis, Também pode ocorrer o contrário, que o médico venha a sentir desejo de proximidade, amor, ou aprovação em relação à família. Estas reações são denominadas, na teoria psicanalítica, de constratransferência, e a sua devida compreensão pode se tornar uma ferramenta para que o médico entenda melhor a si mesmo e à família.

Além das experiências pessoais do médico, existem aspectos de sua personalidade que podem dificultar o relacionamento tanto com o paciente individualmente, quanto com a família. Um médiico demasiadamente narcisista (que tem um senso de auto-estima demasiadamente frágil e dependente da aprovação dos outros) pode ter dificuldades em lidar com críticas, comportamentos de oposição à sua autoridade, e com toda uma gama de sentimentos que a família pode depositar nele, (frustração, raiva, impotência, medo ... ). Ele será visto pela família, em algum momento, como um “representante" do universo da doença e dos serviços de saúde (e, neste caso, muitas vezes as queixas são justificadas e realistas), e cabe ao profissional ter suficientemente continência (capacidade de entender e tolerar tais sentimentos, sem revidá-los).
Há situações em que, por mais que o paciente esteja orientado, não segue as orientações médicas. Afastadas outras causas, como as dificuldades financeiras, o médico deve investigar o ganho secundário da doença: as vantagens ou benefícios obtidos através dos sintomas, de exames, ou da condição de enfermo. São relativamente freqüenntes os casos de pessoas que, em função de seus problemas de saúde, passam a deter um enorme poder no interior do sistema familiar, mantendo com isso privilégios pessoais. O ganho secundário pode ter uma função comunicativa, quando a persistência do sintoma ou o boicote ao tratamento servem para expressar sentimentos de raiva, por exemplo, em relação ao marido, ao patrão, ou ao próprio médico ou serviço de saúde. Outras veezes, a doença pode servir para manter a estabilidade do sistema familiar, como já mencionamos anteriormente (Cataldo Neto e cols., [199?]; Soar Filho, 1998),

Diante do alto nível de responsabilidade da profissão médica, o auto-exame é parte indispennsável de sua prática. A melhor garantia contra os impulsos prejudiciais à relação, que se tornam manifestos no comportamento, é a mais ampla conscientização, por parte do médico, de seus sentimentos, necessidades e conflitos.

Referência:

Soar Filho, E.J. (2003). O médico e a família do paciente. Em: A. Cataldo Neto; G.J.C. Gauer & N.R. Furtado (org.). Psiquiatria para estudantes de Medicina. Porto Alegre: edipucrs.


25 março 2007

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Campos de tulipas, Holanda, 1987.


23 março 2007

Em busca


Mas nem mesmo com referência às mais insignificantes coisas da vida somos nós um todo materialmente constituído, idêntico para toda a gente e de que que cada qual não tem mais do que tomar conhecimento, como se se tratatasse de um livro de contas ou de um testamento; nossa personalidade social é uma criação do pensamento alheio. Até o ato tão simples a que chamamos "ver uma pessoa conhecida" é em parte um ato intelectual. Enchemosa aparência física do ser que estamos vendo com todas as noções que temos a seu respeito; e, para o aspecto total que dele nos representamos, certamente contribuem essas noções com a maior parte.

Marcel Proust em No caminho de Swann.

Mais sobre Proust.

Mais sobre a construção social da identidade, em Pirandello.


Lagoa da Conceição

à beira das rendeiras
vejo o sol a pino
respingar estrelas
sobre a pele da lagoa.
duas velas acariciam
a pele macia da lagoa.
os montes se debruçam para beijar
a úmida pele da lagoa
e toco uma vez mais
com olhos ávidos
a suave pele morena da lagoa.

19 março 2007

Bico de pena


Caneta hidrográfica sobre papel. Desenho de 1983.


15 março 2007

The road to Escondido


A parceria entre JJ Cale e Eric Clapton é de longa data, e está marcada sobretudo pela gravação que este fez "Cocaine" na década de 70, canção escrita por Cale. O jeito tranquilo de Cale tocar e cantar também causou uma importante influência no estilo de Clapton. Não é sem razão que Cocaine é a música de abertura do DVD Crossroads: Guitar Festival (2005), gravado durante o enorme festival de blues que Clapton promoveu no Texas. Dele participa também JJ Cale, além de outros gigantes como BB King, Buddy Guy e Robert Cray.
Essa parceria é coroada agora com este CD, co-produzido por ambos. Quase todas as quatorze faixas de The road to Escondido são composições de JJ Cale, que aparece em primeiro plano nas interpretações. Clapton, desta vez, participa reverentemente como segunda guitarra, faz alguns solos e vocais. A única composição de Eric Clapton (interpretada por ele), Three Little Girls, não deixa dúvidas da autoria: uma canção para guitarra acústica ao estilo de Tears in Heaven. As músicas vão de baladas com sotaque bem country, como a faixa cinco, Sporting Life Blues, até faixas francamente blue-grass, como a seguinte, Dead End Road. Neste álbum está a última participação de Billy Preston, antes de sua morte. Ele é o genial tecladista que dá um show no DVD One more car one more rider, do mesmo Eric Clapton.

No site da Amazon é possível ouvir uma palhinha de cada faixa.


Música para cozinhar













Oda al tomate
Pablo Neruda
Aqui magistralmente interpretada por Jorge Drexler no CD Eco2.

La calle se llenó de tomates.
Mediodía, verano,
la luz se parte en dos mitades de tomate,
corre por las calles el jugo.
En diciembre se desata el tomate,
invade las cocinas,
entra por los almuerzos,
se sienta reposado en los aparadores,
entre los vasos, las mantequilleras, los saleros azules.
Tiene luz propia, majestad benigna.
Debemos, por desgracia, asesinarlo:
se hunde el cuchillo en su pulpa viviente.
Es una roja víscera, un sol fresco, profundo, inagotable.
Llena las ensaladas de Chile,
se casa alegremente con la clara cebolla,
y para celebrarlo se deja caer aceite,
hijo esencial del olivo,
sobre sus hemisferios entreabiertos.
Agrega la pimienta su fragancia,
la sal su magnetismo:
son las bodas del día.
El perejil levanta banderines,
las papas hierven vigorosamente,
el asado golpea con su aroma en la puerta,
es hora! vamos!
Y sobre la mesa, en la cintura del verano,
el tomate, astro de tierra,
estrella repetida y fecunda,
nos muestra sus circunvoluciones, sus canales,
la insigne plenitud y la abundancia sin hueso, sin coraza, sin escamas ni espinas.
Nos entrega el regalo de su color fogoso
y la totalidad de su frescura.

08 março 2007

Dia Internacional da Mulher

A melhor forma de homenagear as mulheres e tentar entendê-las melhor!
Parabéns a todas vocês!!!

da genial cartunista argentina Maitena

07 março 2007

Interdisciplinaridade

Tenho um capítulo publicado no livro Paradigmas da Modernidade e sua Contestação, organizado por Franz Brüseke e Alan Serrano, com textos produzidos por alunos e professores do Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas da UFSC (Editora Insular, Florianópolis, 2006).
O capítulo leva o pomposo título de "Para uma concepção ecossistêmica e interdisciplinar do self". Nele, faço um breve apanhado das transformações pelas quais vem passando o paradigma da ciência (da ciência tradicional à contemporânea), o surgimento e as bases do pensamento sistêmico, e uma proposta de concepção interdisciplinar de self (ou seja, do "eu", da identidade ou da mente). A figura abaixo reproduz um dos diagramas que utilizo para ilustrar os vários aspectos complementares das teorias do self, os modelos aos quais eles correspondem (médico, psicodinâmico e interpessoal), e as formas de intervenção terapêuticas correspondentes. Este esquema permite pensar o self de maneira interdisciplinar, sob uma lógica que Edgar Morin denomina de "aditiva" (que agrega diferentes perspectivas), em oposição à lógica "disjuntiva" (que separa), com a qual opera a ciência tradicional. Abaixo, a transcrição de segmento do texto original no qual tento deixar claro como penso a interdisciplinaridade na clínica psiquiátrica.

Pensado em termos da clínica psiquiátrica, este modelo permite a compreensão de como os relatos dos problemas que nos são trazidos pelos clientes podem ser organizados de acordo com um ou mais dos modelos operativos do médico/terapeuta, dando origem a diferentes "histórias clínicas" e condutas terapêuticas. A partir de queixas genéricas tais como irritabilidade, tristeza, insatisfação crônica consigo mesmo, e brigas constantes com o cônjuge, abrem-se múltiplas possibilidades de investigação, organização e denominação dos problemas. Os "sintomas" (usar esta palavra já implica numa determinada opção epistemológica) podem ser definidos como "distimia" (um tipo particular de "transtorno de humor", conforme a Classificação Internacional de Doenças), o que conduz ao uso de medicamenntos antidepressivos. As mesmas queixas podem ser caracterizaadas como expressão de uma "estrutura narcísica de personalidade" (segundo uma psicopatologia psicanalítica), caso em que serão abordadas as falhas do desenvolvimento psicossexual do indivíduo, através de uma psicoterapia. Uma terceira possibilidade (e não a última delas) é a organização do relato centrada nos problemas da relação conjugal, na focalização das pautas de interação familiar e de retroalimentação das condutas (note-se que, no campo das terapias familiares, há uma tendência hegemônica ao abandono das nosografias - i.e., ao uso de diagnósticos -, tanto médicas quanto psicológicas), implicando esta opção numa correspondente proposta de intervenção na forma de terapia conjugal ou familiar.

Há problemas para os quais um paradigma pode ter se estabelecido como dominante, e impor-se sobre os demais. É o caso do "transtorno afetivo bipolar" ou das "esquizofrenias", para cuja compreensão e tratamento o modelo médico tem-se mostrado indispensável. O mesmo não se pode afirmar sobre os sintomas conversivos e os comportamentos histriônicos, que constituem um território pouco permeável ao modelo médico, e propício às abordagens psicodinâmicas. Por outro lado, a terapia familiar tem se mostrado especialmente útil no tratamento de problemas de conduta na infància e na adolescência, que via de regra respondem de forma pobre a outras modalidades terapêuticas isoladas, apenas para ficarmos no campo dos exemplos mais comuns.

O fundamental, na perspectiva que vimos construindo, é poder situar-se epistemologicamente em relação a esses modelos, compreendê-Ios como diferentes recortes da realidade, perceber suas virtualidades e limitações, e operá-Ios segundo os conhecimentos e treinamentos de cada um. Isto significa, tammbém, reconhecer a unidade e a complexidade do ser humano, ao mesmo tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico, caracterizado, como afirma Morin, por sua condição tripartite de um indivíduo que se situa entre a espécie e a sociedade.

05 março 2007

5 de março

Como antecipei aqui a proximidade de meu cinqüentenário, e como tenho recebido várias manifestações carinhosas a este respeito, quero assinalar a data de hoje. Agora sim, estou entrando na minha MAIORidade.
Nasci no ano de 1957, numa terça de Carnaval, e meu amigo Arthur me informa que só com 62, em 2019, o dia 5 será novamente terça de carnaval!
Busquei na net algum evento mais significativo que tivesse ocorrido nesta mesma data. Encontrei num site que celebra a paz no mundo (link) a notícia seguinte, e acho que é um bom marco para associar ao meu aniversário:

Entrada em vigor do Tratado de não Proliferação das Armas Nucleares, 1970

O Tratado de não Proliferação das Armas Nucleares (NTP) é a pedra fundamental dos esforços internacionais para evitar a disseminação de armas nucleares e para viabilizar o uso pacífico de tecnologia nuclear da forma mais ampla possível. Aberto para assinatura em 1968, o Tratado entrou em vigor em 5 de Março de 1970. Entre 1968 e 2005, foram realizadas revisões periódicas do NPT, em 1975, 1980, 1985, 1990, 1995, 2000 e 2005. Em 1995, os Estados participantes concordaram em prolongar indefinidamente o NPT, como parte integrante de um conjunto de decisões que incluía o reforço do processo de revisão, e princípios e objectivos para a não-proliferação e desarmamento. 190 países ratificaram este tratado inclusive as cinco grandes potências nucleares e membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU: Estados Unidos, Reino Unido, Rússia, China e França.

Para Julia

Em homenagem ao nascimento de minha sobrinha Julia, ocorrido hoje pela manhã, no mesmo dia de meu aniversário. Ela é, portanto, o maior presente que poderia receber, e deixo publicamente o meu carinho e os votos de felicidades ao meu irmão Rafael e à Doris, essa nova brava mãe.
Desenho de 1974, feito com caneta hidrográfica.

01 março 2007

(L)ula-lá!!!! De novo!

Ouvi na CBN que ontem, no apagar das luzes, a Câmara Federal aprovou nova medida provisória para a doação de mais vinte milhões de reais (veja notícia de uma doação anterior para o Paraguai aqui), desta vez para a Bolívia. A finalidade é contribuir para a solução de conflitos fundiários e a implantação da reforma agrária no nosso país vizinho, que, como todos sabemos, tanto apreço e consideração tem demonstrado pelo Brasil. Não bastasse a desmoralização a que fomos submetidos, o Lula ainda quer dar uma de bonzinho... Será que está sobrando dinheiro? Será que o povo brasileiro não está precisando de nada??? E a conta, nós é que pagamos!

Silje Nergaard

Meu amigo, blogueiro, e grande conhecedor de boa música, Aluizio Amorim, publicou em seu blog, e eu repasso pra vocês o comentário dele e o link para esta maravilhosa interpretação da cantora norueguesa Silje Nergaard (clique aqui).

É linda, simpática e tem uma voz cativante, meiga e afinadíssima. Notem a sofisticação e a delicadeza do arranjo. Silje transita do pop ao jazz. Destaco neste vídeo uma música muito bonita, We should be happier by now, num fantástico dueto que ela faz com o competente e veterano Al Jarreau. Este vídeo é uma versão intimista em estúdio. Vale a pena ouvir. Para visitar o site de Silje, clique aqui".