20 dezembro 2009

depressão de natal


Não é incomuns que algumas pessoas tornem-se mais tristes ou angustiadas com a proximidade do final de ano e do Natal. Se você mesmo não é uma delas, possivelmente conhece alguém que seja assim. Na maior parte dos casos são queixas imprecisas e de origem pouco clara: um sentimento de vago de nostalgia, um desconforto indefinido, um estado de tristeza para o qual os americanos têm um nome muito apropriado: blues. Mas pode também acontecer de se instalar um estado de depressão clínica, que necessite intervenção profissional. Há inclusive estatísticas que mostram que nessa época ocorre um aumento significativo no número de suicídios.

Um dos sinais típicos desse fenômeno é o adiamento das compras e dos preparativos para o Natal e o Ano Novo. O que deveria ser motivo de entusiasmo e alegria torna-se um fardo, e na medida em que essas datas se aproximam mais pesado ele se torna. Aumenta a ansiedade e com ela a irritabilidade e a tristeza. Num momento em que tudo à volta remete a sentimentos de alegria e à busca de proximidade, a pessoa sente-se extremamente inadequada, pois deseja isolar-se e não sente desejo de confraternizar-se. Sente-se culpada por não estar participando da alegria dos amigos e familiares, e fica ainda mais deprimida.

Não raro as pessoas conseguem identificar um ou mais fatores que contribuem para estarem depressivas. A perda de qualquer ente querido numa época marcada pela reunião familiar é um forte motivo de depressão. Não apenas a perda por falecimento – especialmente quando recente – mas a falta de filhos que foram morar longe ou a saudade de um irmão que há tempo não se vê. O mesmo vale para as separações conjugais e tudo o mais que possa contribuir para a solidão. As dificuldades financeiras e a impossibilidade de realizar os desejos das pessoas amadas, especialmente das crianças, podem estar também implicadas como causas.

Muitas vezes, entretanto, a pessoa que está acometida desse estado depressivo não consegue identificar nenhum motivo razoável, o que só faz aumentar a culpa e o sentimento de inadequação. Experiências infantis significativas tendem a ser reativadas pela proximidade das festas. Nem sempre experiências boas, diga-se de passagem. Um pai de família pode vivenciar sentimentos muito ambivalentes de alegria e tristeza ao propiciar aos seus filhos aquilo que ele mesmo não teve na sua infância. O Natal pode remeter a lembranças da ausência do pai, de cenas de violência doméstica, ou da miséria que sonegava os presentes tão desejados por ele quando era criança.

Aliás, é bom lembrar que relacionamentos humanos são, por natureza, ambivalentes. Tanto mais quando se trata das relações familiares, tratadas culturalmente como sagradas. Quando as famílias se reúnem, assim como se renovam os vínculos de amor, reativam-se também – geralmente num nível inconsciente – sentimentos de competição, de inveja e ciúme, assim como ressentimentos e mágoas antigas. Por essa razão o ato de presentear pode vir a ser um verdadeiro problema para alguns. As compras de Natal envolvem não apenas decisões de economia financeira (o quanto posso gastar), mas também aquelas de economia emocional (o quanto quero gastar, se baseio minha escolha no valor econômico do presente ou no significado emocional, se quero expressar gratidão ou mostrar-me superior ao outro, etc.). Quanto maior o conflito e a ambivalência, tanto maior poderá ser a angústia envolvida. A pessoa pode ficar muito indecisa e ter dificuldade de fazer uma escolha, ou então sentir-se cansada, frustrada, ou mesmo irritada por ter de presentear determinadas pessoas. Lidar com esses sentimentos pode ser difícil, especialmente quando não estão muito claros para quem os vivencia.

Muitos não se dão conta de que o período de final de ano é particularmente estressante também do ponto de vista das tarefas práticas. Organizar festas, comprar presentes, preparar viagens, gerenciar orçamentos e pessoas, tudo isso pode ser fonte de muita ansiedade. Mas há ainda outro aspecto importante: o final de ano é um momento de avaliação de ganhos e perdas, de sucessos e fracassos. É nessa época que olhamos para trás e constatamos quantos de nossos planos se realizaram, e quantos não. Parece haver uma percepção comum de que o tempo vem passando mais rápido, e com ela, a sensação de que não damos conta de fazer tudo o que havíamos planejado, que estamos perdendo oportunidades, que estamos envelhecendo mais rapidamente do que gostaríamos... O final de ano é uma ocasião que praticamente nos impõe a reflexão sobre nossas vidas e a passagem dos anos. A inexorável passagem do tempo, nas palavras de Roberto Bolaño, “o estalido dos anos, o despenhadeiro das ilusões, a quebrada mortal dos afãs de todo tipo”.

No ano que vem tem mais....