24 dezembro 2006

BOAS FESTAS!


Estarei fora do ar nas próximas duas semanas.
A todos os amigos, os meus votos de boas festas e um ótimo 2007!
Espero que nos re-encontremos aqui em breve, com renovadas energias.
Beijo pra quem for de beijo, abraço pra quem for de abraço.
Ercy


22 dezembro 2006

Imagina Chico e Mônica

Imagina
Imagina
Hoje à noite
A gente se perder
Imagina
Imagina
Hoje à noite
A lua se apagar
Quem já viu a lua cris?
Quando a lua começa a murchar
Lua cris
É preciso gritar e correr
Socorrer o luar
Meu amor
Abre a porta para a noite passar
E olha o sol da manhã
Olha a chuva
Olha a chuva, olha o sol
Olha o dia a lançar serpentinas
Serpentinas pelo céu
Sete fitas
Coloridas
Sete vias
Sete vidas
Avenidas para qualquer lugar
Imagina
Imagina


Carioca é o último CD de Chico Buarque, e de todas as faixas, por várias razões, escolhi a última: "Imagina", esta canção escrita em parceiria com Tom Jobim, em 1983, e aqui interpretada com a participação de Mônica Salmaso.
Mapa da mina: clique no CD para ir ao site do Chico, clique no CD novamente, clique na faixa, e por fim no ícone do toca-discos. (Um dia desses o João David ainda me ensina a baixar MP3 e tornar as coisas mais simples.)

ESTE POST É DEDICADO À MAGNA.

Bico de pena

Também já fui Quixote.

Le Mystère Picasso

Cena do filme de Henri-Georges Clouzot, revelando o processo de criação de Picasso.
A amizade entre o diretor francês e Pablo Picasso permitiu que ele filmasse o artista durante a criação de vinte trabalhos originais. Picasso destruiu praticamente todas as telas depois da filmagem. Este filme, de 1956, foi declarado um tesouro nacional da França em 1984.

CLIQUE NO CARTAZ PARA VER

18 dezembro 2006

Lacan para principiantes

Esta bem humorada animação ensina definitivamente, aos não iniciados nas artes do bruxo Lacan, o princípio terapêutico do "tempo lógico". Clique na figura.

Fonte: oraculum, onde há também uma bela poesia sobre o quadro de Gustav Klimt, O beijo.

17 dezembro 2006

Jarros

A partir de uma foto de celular, feita em Santo Antônio de Lisboa.

O céu ao revés

Presentes de Natal

Fernando Mansur me entrevista no Momento Temperado desta semana. Conversamos sobre o Natal. Os temas abordados foram: os significados - explícitos e ocultos - do ato de presentear, o consumismo, e os transtornos psiquiátricos associados à compras.
O programa vai ao ar nos seguintes horários e canais:
Inédito:
Sábado, dia 16 de dezembro, às 21h:30 e 23h:30.
Reapresentações:
Terça, dia 19 de dezembro, às 17h30. Quinta, dia 21 de dezembro, às 23h:30.
Pela TvCom, canal 36 da Net e Viamax.

15 dezembro 2006

Os mapas do mundo







Nestes mapas estranhos (clique para ampliar), os tamanhos dos países foram redimensionados de acordo com dois indicadores de saúde. No mapa da esquerda, estão representados os gastos públicos com saúde, no da direita a prevalência de HIV.
Neste site, chamado WORLDMAPPER, você pode encontrar dezenas de indicadores sócio-econômicos representados através desse recurso. Como diz o subtítulo do site, é "o mundo como você nunca viu antes".

Meus leitores

Tenho acompanhado com curiosidade o registro de visitas ao meu blog. Posso constatar que tenho um seleto grupo de leitores (ou visitantes), em sua maioria provenientes de Santa Catarina, como não poderia deixar de ser.
O instrumento de registro pode fornecer a localidade do IP de cada visitante, além do tempo de permanência e número de páginas visitadas. Num levantamento realizado hoje, das últimas 100 visitas, são as seguintes as localidades do estado registradas: Florianópolis, Gaspar, São José, Camboriú, Rio do Sul, Papanduva, Orleans, Itapema, Massiambu Pequeno (não é nome de município) e "Cubculo" (abreviatura de alguma localidade que não pude identificar).
Agradeço o interesse dos visitantes, e os convido deixarem seus comentários.

14 dezembro 2006

E aí, tudo bem meu irmão?

Qualquer semelhança NÃO é mera coincidência!

Processo de hominização


Os critérios tradicionais de animalidade e humanidade têm sido colocados em xeque por inúmeros estudos etológicos, principalmente aqueles conduzidos com os chimpanzés, os animais mais próximos evolutivamente ao ser humano, cuja estrutura de DNA apresenta uma semelhança com a humana da ordem de 98%. Tais estudos deixam claro que estes primatas não apenas são capazes de construir e utilizar ferramentas, como de transmitir esse conhecimento às gerações mais novas; de utilizar formas de comunicação simbólica; além de apresentarem comportamentos de evitação do incesto.
A partir de seu extenso trabalho de observação de chimpanzés, Fouts relata os processos de aprendizagem e de transmissão trans-geracional da utilização da linguagem de sinais dos mudos por estes primatas, através da qual evidenciou recursos mentais muito superiores àqueles tradicionalmente aceitos no mundo animal, como a utilização de sintaxe nas frases; a classificação através de tipos lógicos; a utilização de operações mentais complexas envolvendo algumas generalizações e abstrações; além da capacidade de pensamento dedutivo, de memória e de planejamento de ações futuras. Estes recursos mentais colocam por terra os pressupostos cartesianos da desvinculação do ser humano do mundo animal e da separação entre razão e intuição, e contradizem a hipótese de Chomsky da existência de um órgão de linguagem – uma estrutura neurológica – que seria especifico da espécie humana. Ao contrário, sugerem que, através da manipulação ambiental, um bebê pode ter seu cérebro influenciado para que se afaste do processo simultâneo de inteligência, que é tão crucial na selva, e se oriente para o processo sequencial requerido para a linguagem humana.
Dois atributos ainda distinguem o ser humano de seus parentes próximos, os grandes símios: (A) a capacidade de construir e utilizar ferramentas para utilizar outras ferramentas (por exemplo, usar uma linha na agulha), e (B) a consciência da própria consciência.
Por fim, é bom lembrar que, a rigor, está errado chamar de "macacos" os grandes primatas (chimpanzés, gorilas, orangotangos e bonobos). Eles constituem uma família diversa dos "outros" macacos, e sua linhagem evolutiva provém de um ramo comum a nós, humanos.
Referências:
FOUTS, R. (1998) O parente mais próximo: o que os chipanzés me ensinaram sobre quem somos. Rio de Janeiro: Objetiva.
MATURANA, H. & VARELA, F. (1995) A árvore do conhecimento: as bases biológicas do entendimento humano. Campinas: Editorial Psi.
SMITH, C.M. (2006) O despertar da mente moderna. Viver mente&cérebro, novembro.
WERNER, D. (1997) O pensamento de animais e intelectuais: evolução e epistemologia. Florianópolis: Editora da UFSC.

13 dezembro 2006

O Foda-se

(Este texto é atribuído a Millôr Fernandes. Em tempos de www, não se pode mais ter certeza da autoria de nada. Principalmente se vier com assinatura de Luis Fernando Veríssimo ou Arnaldo Jabor, dois das maiores vítimas daqueles que se querem fazer lidos sem ter qualquer mérito para isso. Assim, embora o texto faça inteira juz à genialidade do Millôr, faço esta ressalva)

O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional a quantidade de foda-se! que ela fala. Existe algo mais libertário do que o conceito do foda-se!? O Foda-se! aumenta minha auto-estima, me torna uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Me liberta. Não quer sair comigo? Então, foda-se!. Vai querer decidir essa merda sozinho(a) mesmo? Então foda-se!. O direito ao foda-se! deveria estar assegurado na ConstituiçãoFederal.
Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para prover nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo fazendo sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia.
Prá caralho, por exemplo. Qual expressão traduz melhor a idéia de muita quantidade do que prá caralho? Prá caralho tende ao infinito, é quase uma expressão matemática. A Via-Láctea tem estrelas prá caralho, o Sol é quente prá caralho, o Universo é antigo prá caralho, eu gosto de cerveja prá caralho, entende? No gênero do Prá caralho, mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso Nem fodendo!. O Não, não e não! e tampouco o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade Não, absolutamente não! o substituem. O Nem fodendo é irretorquível, e liquida o assunto. Te libera, com aconsciência tranqüila, para outras atividades de maior interesse em sua vida. Aquele filho pentelho de 17 anos te atormenta pedindo o carro pra ir surfar no litoral? Não perca tempo nem paciência. Solte logo um definitivo:
- Marquinhos presta atenção, filho querido, NEM FODENDO!
O impertinente se manca na hora e vai pro Shopping se encontrar com a turma numa boa e você fecha os olhos e volta a curtir o CD do Lupicínio.
Por sua vez, o Porra nenhuma! atendeu tão plenamente as situações onde nosso ego exigia não só a definição de uma negação, mas também o justo escárnio contra descarados blefes, que hoje é totalmente impossível imaginar que possamos viver sem ele em nosso cotidiano profissional. Como comentar a gravata daquele chefe idiota senão com um PhD porra nenhuma!, ou ele redigiu aquele relatório sozinho porra nenhuma!. O porra nenhuma, como vocês podem ver, nos provê sensações de incrível bem estar interior. É como se estivéssemos fazendo a tardia e justa denúncia pública de um canalha. São dessa mesma gênese os clássicos aspone, chepone, repone e mais recentemente, o prepone - presidente de porra nenhuma.
Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um Puta-que-pariu!, ou seu correlato Puta-que-o-pariu!, falados assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba... Diante de uma notícia irritante qualquer puta-que-o-pariu! dito assim te coloca outra vez em seu eixo. Seus neurônios têm o devido tempo e clima para se reorganizar e sacar a atitude que lhe permitirá dar um merecido troco ou o safar de maiores dores de cabeça. E o que dizer de nosso famoso Vai tomar no cu!? E sua maravilhosa e reforçadora derivação vai tomar no olho do seu cu!. Você já imaginou o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: Chega! Vai tomar no olho do seu cu!. Pronto, você retomou as rédeas de sua vida, sua auto-estima. Desabotoa a camisa e sai a rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios.
E seria tremendamente injusto não registrar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: Fodeu!. E sua derivação mais avassaladora ainda: Fodeu de vez!. Você conhece definição mais exata, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusive, que uma vez proferida insere seu autor em todo um providencial contexto interior de alerta e autodefesa. Algo assim comoquando você está dirigindo bêbado, sem documentos do carro e sem carteira de habilitação e ouve uma sirene de polícia atrás de você mandando você parar: O que você fala? Fodeu de vez!.
Liberdade, igualdade, fraternidade e ...Foda-se!)
Em tempo: Millôr comete neste texto uma injustiça, ou um pequeno esquecimento, como prefiro acreditar. Não menciona o meu palavrão predileto, e dos que considero mais úteis para lavar a alma, quando algo dá errado. Portanto, faço questão de aqui lembrá-lo: MERDA!, e, quando se quer dar ainda maior ênfase, o sonoro PUTA MERDA!!!

12 dezembro 2006

Quino

Será que Quino estava pensando no Brasil quando desenhou isto?...

História da Beleza

História da Beleza
Organização de Umberto Eco
Tradução de Eliana Aguiar
Rio de Janeiro: Record, 2004
438 páginas

Este livro é uma BELEZA!!!

Já o havia citado em minha tese, onde transcrevo um trecho final no qual Umberto Eco imagina a dificuldade de um suposto viajante interplanetário indentificar qual o conceito de beleza em nossos dias, neste planeta:

Os mass media, por sua vez, não apresentam mais nenhum modelo unificado, nenhum ideal único de Beleza. Podem recuperar, mesmo em uma publicidade destinada a durar uma única semana, todas as experiências da vanguarda e, ao mesmo tempo, oferecer modelos dos anos 20, anos 30, anos 40, anos 50, até a redescoberta das formas fora de uso dos automóveis da metade do século. Os meios de comunicação repropõem uma iconografia oitocentista, o realismo fantástico, a opulência junonal de Mae West e a graça anoréxica das últimas modelos; a Beleza Negra de Naomi Campbell e a nórdica Claudia Schiffer; a graça do sapateado tradicional de A Chorus Line e as arquiteturas futuristas e petrificantes de Blade Runner. [...] O nosso explorador do futuro já não poderá distinguir o ideal estético difundido pelos mass media do século XX e passa. Será obrigado a render-se diante da orgia de tolerância, de sincretismo também, de absoluta e irrefreável politeísmo da Beleza.

10 dezembro 2006

Beijo

Fonte: algum lugar da www.

O mal de Sachs


Este é um livro que recomendo a todo mundo, especialmente aos colegas médicos e estudantes de medicina.

O mal de Sachs é o segundo romance de Martin Winckler, pseudônimo de Marc Zaffran - um médico convertido à literatura, segundo a tradição de Tchekhov, Céline e tantos outros. Trata-se de uma espécie de diário do "médico rural" dr. Bruno Sachs, mas com uma particularidade: os narradores são os pacientes - velhos e velhas, homens, mulheres e crianças que habitam a comunidade imaginária de Play, a secretária do dr. Bruno, a mãe, os colegas médicos. Aos poucos as descrições que eles fazem vão traçando não só o perfil desse homem atencioso na relação com os pacientes - embora se mantenha solitário e misterioso em sua vida privada -, mas dos próprios clientes, cujas manias e idiossincrasias revelam-se ora cômicas, ora dramáticas.Tudo gira em torno da figura do médico, em torno da vulnerabilidade e da perspectiva da morte, e o "mal" de Sachs, nesse caso, é a própria medicina. O dr. Sachs é tão vulnerável e humano quanto os seus pacientes, um homem extremamente preocupado com a ética da profissão, um médico que tem ao mesmo tempo horror a médicos e a consciência de que é impossível deixar de ser um deles.Embora recuse para este livro o rótulo de autobiografia, Winckler teve uma experiência de dez anos como clínico geral no interior da França, e não há dúvida de que as consultas relatadas por ele são fruto de observação. Sua invenção narrativa está em transformar os pacientes em observadores do médico.Lançado em janeiro de 1998 na França, O mal de Sachs logo conquistou o público e a crítica e em 1999 foi transformado em filme.
Aqui vão algumas "pílulas" do Dr. Sachs:

- O que é que o senhor tem?
- Bem, sei lá, o senhor é que tem que me dizer! Eu não sou médico

A descrição de todas as doenças catalogadas me passou diante dos olhos, e imaginei que, se conhecesse os sintomas de todas as afecções mortais, e se os rememorasse regularmente, ficaria imunizado contra elas. Bem mais tarde, compreendi que as doenças dos tratados são elas mesmas apenas o produto de uma sistemática arbitrária. Na vida real, não se morre como nos livros de medicina.

Os médicos mentem, não porque têm medo de dizer a verdade, mas porque-os-pacientes-preferem-não-saber. Afinal de contas, não vamos forçá-los!
Os médicos atormentam, não para fazer sofrer, mas porque-querem-tentar-tudo-para-salvar-seus-pacientes. Afinal de contas, não vamos recriminá-los!
Os médicos experimentam, não porque são sádicos, mas porque-têm-que-se-fazer-a-ciência-avançar. Afinal de contas, não vamos impedi-los!

A primeira vez que senti um tumor no seio foi no seio de uma mulher com quem eu estava fazendo amor.


09 dezembro 2006

Lexicon (4)

PALÍNDROMO
Uma frase que lida de trás pra frente permanece a mesma, ou seja, é igual da esquerda pra direita ou vice-versa.
Roma me tem amor
A base do teto desaba
Lá vou eu em meu eu oval

BUSTROFÉDONS
ou PARAPALÍNDROMOS, são palavras que lidas da esquerda para a direita se tornam outras palavras, como Roma e amor, após e sopa, assim e missa, ar e rã...

Fonte: "aí é luta, patuléia!", revista Piauí, nov.2006.
Lexicon (3)

Adendo (a partir de comentário do Arthur):
adv. gr. boustrophédón (de boûs 'boi' e strophê 'volta'), por intermédio do fr. boustrophedón 'virando-se de uma linha para a outra como os bois fazem no campo'.

07 dezembro 2006

Em busca de Marcel Proust

Este post contou com a inestimável colaboração de Magna Martins, que forneceu as imagens e os textos, e antes disso, a inspiração.


Marcel Proust (Auteuil, julho de 1871 — Paris, 18 de Novembro de 1922 ), Portrait de Jacques-Emile Blanche


La chambre de Marcel Proust . "Proust ficava no leito, acabrunhado pela nostalgia, nostalgia de um mundo deformado pela semelhança, no qual irrompe à luz do dia o verdadeiro rosto da existência, o surrealista" (W. Benjamin).

Um caminho que aparece na obra. Em Combray, a cidade da infância.

La maison de tante Léonie - La recherche du temps perdu.



Ultimo parágrafo de No Caminho de Swann, primeiro volume de Em Busca do Tempo Perdido:

"[...] A natureza recomeçava a reinar sobre o Bois, de onde se
alara a idéia de que era o Jardim Elísio da Mulher; acima do moinho falso, o verdadeiro céu era cinzento; o vento enrugava o Grande Lago em pequeninas vagas, como um lago; grandes pássaros cruzavam rapidamente o Bosque, como a um bosque, e soltando gritos agudos, pousavam um após outro nos grandes carvalhos que, sob a sua coroa druídica e com uma majestade dodônea, pareciam proclamar o vazio inumano da floresta desapropriada, e me ajudavam a melhor compreender a contradição que existe em procurar na realidade os quadros da memória, aos quais faltaria sempre o encanto que lhes vem da própria memória e de não serem percebidos pelos sentidos. A realidade que eu conhecera não mais existia. Bastava que a sra. Swann não chegasse exatamente igual e no mesmo momento que antes, para que a avenida fosse outra. Os lugares que conhecemos não pertencem tampouco ao mundo do espaço, onde os situamos para maior facilidade. Não eram mais que uma delgada fatia no meio de impressões contíguas que formavam a nossa vida de então; a recordação de certa imagem não é senão saudade decerto instante; e as casas, os caminhos, as avenidas são fugitivos, infelizmente, como os anos."

Jogos





Duas ótimas tiradas do Juca Kfouri, em seu programa diário “CBN Sport Club”:

Está na hora de tomar chá de cadeira!
Chá de cadeira: o chá que tomam todos aqueles que esperam a queda de Ricardo Teixeira.

Ajude as Casas da Terceira Idade!
Casas da Terceira Idade: avós do Brasil.

06 dezembro 2006

Segurança em ônibus

Dicas de uma especialista em trânsito, minha amiga e leitora deste blog, para viajar de ônibus com mais segurança.

  1. Ao contrário do que se imagina, as estatísticas comprovam que é mais seguro viajar no lado esquerdo do ônibus (o lado do motorista, que sempre tenta livrar a própria cara!), aproximadamente no centro (nem muito na frente nem atrás), na poltrona do corredor. É também onde balança menos!
  2. Exija - e USE - o cinto de segurança!
  3. Esta dica é minha: vá dormindo, que não adianta nada ir sofrendo a viagem inteira. Ah, e se tiver alguma fé, não custa rezar para o seu santo que uma proteção extra nunca é demais!

05 dezembro 2006

A chave do prazer


Estudo sobre perfil sexual do brasileiro mostra preferências, dificuldades e quebra mitos na relação a dois

Abra esta porta e descubra o que o sexo pode ser na vida de cada um. Com menos mitos, mais verdades e, sobretudo, com "paixão, amor, intimidade, atração, como pregam os mais afeitos. Sem essa receita, é apenas um arremedo, uma caricatura. Seja lá como for, arremedo ou obra-prima, o sexo sempre surpreende os iniciantes, enleva os iniciados e deixa saudades nos desertores", diz a psiquiatra Carmita Abdo, pesquisadora da sexualidade humana desde 2000.
Professora da Faculdade de Medicina na Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do Projeto de Sexualidade (ProSex), ela acaba de lançar o livro Sexo pode ser, pela Editora Prestígio, com os principais dados de um estudo amplo sobre os hábitos, as preferências, as práticas e as dificuldades dos brasileiros na cama.










O rapto de Psiquê.
Nesta pintura a bela Psiquê é levada por seu amante imortal, Cupido.
Adolphe-William Bouguereau, 1895.

O livro foi escrito a partir da análise de uma pesquisa com 7.103 homens e mulheres, maiores de 18 anos, que não revelaram a identidade para responder voluntariamente a um questionário de 87 perguntas de múltipla escolha. "A privacidade e o anonimato eram pré-requisitos, para que as respostas fossem as mais sinceras possíveis", explica.
O livro é um resumo do sexo que os brasileiros confessam praticar. Dois terços dos adultos, por exemplo, preferem sexo sem hora marcada. Curiosamente, 7% só fazem sexo em situações especiais. Muitos estão insatisfeitos com a qualidade da ereção, ou seja, quase a metade dos homens (45,1%).
São cinco situações que mais complicam o desempenho sexual, de acordo com a pesquisa: cansaço, rotina, pouco tempo para o sexo, ansiedade e sexo programado. Os riscos envolvidos na atividade sexual ainda são grandes, já que 43,6% das mulheres e 34,9 % dos homens nunca usam preservativo nas relações sexuais.
O sexo pode ser tudo isso: "Prazer hoje, dor ou risco amanhã. Ou, então, orgasmo, receita, beijo, intimidade, fantasia, equilíbrio, queixa, entre outras possibilidades. Pode ser tudo isso e muito mais, dependendo de como, quando e com quem", diz Carmita. Mas a partir de agora, fica por sua conta o que o sexo pode ser.
Pelo menos 70% dos brasileiros consideram o próprio desempenho sexual de bom a excelente em qualquer etapa da vida. Além de mostrar o comportamento sexual do brasileiro, o livro da psiquiatra Carmita Abdo deve servir também como um espelho, no qual se refletem as dúvidas, angústias, medos, dores e, principalmente, as fantasias. Os números mostram que ninguém, homens e mulheres, está só em suas inquietações, dilemas e desejos. Se quase metade dos brasileiros está insatisfeita com a qualidade de suas ereções, uma parcela também significativa não tem controle da ejaculação. De acordo com a pesquisa, um quarto dos homens do Brasil (25,8%) gostaria de melhorar essa performance e conseguir prolongar o ato sexual.
O livro, recheado de estatísticas, derruba o mito de que os brasileiros fazem muito sexo. "Temos duas a três relações por semana. Mas gostaríamos de, se possível, ter o dobro", diz a pesquisadora. A queixa de limitação do parceiro ou do relacionamento atinge 50,9% das mulheres e 48,1% dos homens. A masturbação ainda é um tabu para boa parte das mulheres. "Cerca de um terço das brasileiras nunca se masturbou, enquanto 3,4% dos homens evitam esse tipo de prática sexual. Os homens, por exemplo, confessam que se masturbam freqüentemente ou às vezes (66,2%). Quanto a elas, 42,7% têm esse hábito. Por outro lado, um quarto delas e 30% deles deixaram essa prática no passado.
Mas o sexo pode ser "um desatino, quando se é muito novo ou inseguro. Um tiro no escuro, sem alvo e sem destino ou uma vontade que não pede licença, mas atropela. Pode ser um desabafo, uma válvula de escape. Um saco. Uma porta que se abre para a vida". De forma lúdica e poética, a psiquiatra vai revelando as respostas dos brasileiros. Para ela, o sexo pode ser um desafio, se a atração acabou, se está por um fio. Ou se nunca existiu. Pode ser uma surpresa, o descobrimento, a redenção. Ou uma fraqueza, o desalento, a decepção. Um sacrifício, um sanguessuga, um vício. Uma grande sacada, a reviravolta, a virada. Uma mania, ousadia insistente e repetitiva. Uma prisão, sem solução, sem prazer e sem esquiva. Pode ser o que inspira, faz transpirar e rejuvenesce. O que assegura, mistura e enlouquece. O que declara, a céu aberto, os desejos mais secretos. "Paradoxalmente, muito mais do que se possa dizer, escrever ou expressar, sexo é para fazer, sentir e calar", conclui.
Ao ler as estatísticas publicadas por Carmita, pode-se perceber que o brasileiro imagina mais do que faz. "A maioria ou pelo menos 70% considera o próprio desempenho sexual de bom a excelente em qualquer etapa da vida. Exceto os homens com mais de 60 anos, para quem (ainda assim) os índices de excelente a bom são da ordem de generosos 55%. Pelo menos", diz ela, "em uma auto-avaliação. Melhor não perguntar a opinião do parceiro", brinca. Segundo Carmita Abdo, as primeiras experiências sexuais entre os jovens podem ser frustrantes. Falha de ereção e descontrole na ejaculação ocorreram a 56,7% dos adolescentes na iniciação sexual. Coincidentemente, 56,6% das jovens tiveram dificuldades de orgasmo nessa fase.
Tanto para homens quanto mulheres, o beijo é a expressão mais perfeita e mais aceita da sexualidade. Mas há também que não faça mais sexo. Como afirma a pesquisadora, "por convicção, falta de opção ou aversão, 7,7% das mulheres e 2,5 dos homens não fazem sexo."

Fonte: Estado de Minas, 27/11/06 (texto resumido por mim)
Postado na Lista Brasileira de Psiquiatria e transcrito aqui por ser do interesse geral...

04 dezembro 2006

Cores de Trancoso

Janeiro de 2004, Trancoso, Bahia.

03 dezembro 2006

A bomba atômica e o nascimento dos neurônios

Em sua coluna de novembro, Roberto Lent mostra como os efeitos das armas nucleares foram usados para o bem da humanidade. Pesquisadores inventaram uma forma de usar a radioatividade atmosférica produzida pelos testes atômicos durante a Guerra Fria para resolver uma controvérsia da neurociência: existe ou não a produção de novos neurônios no córtex cerebral dos seres humanos?
O estudo foi realizado através da análise do tecido nervoso do cérebro de pessoas que estiveram expostas a radioatividade do carbono-14, nascidas em regiões onde foram realizados testes atômicos a partir dos anos 1950. Constatou-se que os neurônios nasciam sempre próximos ao nascimento do seu portador, enquanto as demais células se distribuíam por um período posterior de alguns anos, indicando que haviam nascido depois. Como os experimentos foram quantitativos, foi possível estimar um limite teórico máximo de 1% na proporção de neurônios gerados em um período de 50 anos, o que significaria a adição de um neurônio novo a cada coluna de 100 neurônios no córtex. Um acréscimo insignificante para 50 anos de vida!
Clique aqui para ver a notícia completa.

Fonte: Ciência Hoje, coluna Cem Bilhões de Neurônios (link ao lado)
Tópico postado originalmente na Lista Brasileira de Psiquiatria (LPB)

Comentário:
Como já foi comentado na LBP, não se pode esgotar a discussão sobre neuroplasticidade (a capacidade de regeneração do tecido cerebral) em termos apenas de neurogênese (nascimento de novos neurônios). A neuroplasticidade depende sobretudo do estabelecimento de novas conexões entre neurônios já existentes. Isto mantém a questão em aberto....

02 dezembro 2006

Orsay


Duas telas que são motivos suficientes para a visita ao Musée D'Orsay (clique nas imagens para ampliar):












William Bouguereau, La Naissance de Vénus, óleo sobre tela, 1874.











Jean-Dominique Ingres, La Source, óleo sobre tela, 1856.
Esta é a imagem da perfeição, segundo Ingres, que trabalhou neste quadro durante 36 anos.

Renascimento

Recolhida no site do Arthur Müller (link ao lado). Sem créditos do autor.

01 dezembro 2006

O dom de Donne

A MENSAGEM

Devolve os pobres olhos que eu perdi
E que te habitam, desde que te vi.
Mas se eles já sofreram tal castigo
E tantos danos,
Tantos enganos,
Tal rigor,
Que a dor
Os fez inúteis, guarda-os contigo.

Devolve o coração que te foi dado
Sem jamais cometer qualquer pecado.
Porém, se ele contigo já aprendeu
Como se mata
E se maltrata
E se tortura
Uma alma pura,
Guarda, também, esse ex-pedaço meu.

Melhor, devolve olhos e coração,
Para que eu possa ver a traição,
E possa rir, quando chegar a hora
De te ver
Padecer
Por alguém
Que tem
Um coração como o que tens agora

John Donne (1572-1631)
Tradução de Augusto de Campos
Original, em inglês


John Donne (1572-1631) nasceu em Londres, no seio de uma proeminente família católica que se converteu ao Anglicanismo na década de 1590. Aos onze anos de idade ingressou na Universidade de Oxford, e em seguida frequentou também a Universidade de Cambridge. Em 1592 iniciou seus estudos de Direito, e logo tornou-se secretário particular do Guardião do Selo Real. Casou-se secretamente com a filha de seu patrão, aos 26 anos, tendo de trabalhar como advogado. Tornou-se um padre da Igreja Anglicana em 1615, fez fama como pregador, e chegou a ser nomeado bispo da Catedral de St. Paul.

A poesia de Donne abarca um amplo leque de temas profanos e religiosos, passando do tom cínico (como se pode notar na poesia transcrita acima) para o francamente romântico. Qualquer que seja o assunto, os poemas de Donne revelam as características dos poetas metafísicos: jogos sutis de palavras, freqüentemente de cunho sexual; paradoxos; argumentos sutís; constrastes surpreendentes; análises psicológicas intrincadas; e uso de imagens provenientes de áreas não tradicionais como o Direito, fisiologia, filosofia escolástica e matemática.

A prosa de Donne é quase tão metafísica quanto a sua poesia, representada muito bem por seus sermões. Obsecado pela idéia de morte, Donne pregou o que tem sido considerado o seu próprio sermão fúnebre, "Death's Duel", semanas antes de vir a falecer, em Londres, no dia 31 de março de 1631.

Fonte: online-literature.com

30 novembro 2006

O encolhimento do mundo


Uma das metáforas mais poderosas para caracterizar a sociedade contemporânea é a de “compressão do tempo-espaço”, proposta por David Harvey (1992), com a qual ele se refere a “processos que revolucionam as qualidades objetivas do espaço e do tempo a ponto de nos forçarem a alterar, às vezes radicalmente, o modo como representamos o mundo para nós mesmos” (p. 219). Tais processos incluem a aceleração do tempo e a diminuição das distâncias que acompanham a rápida circulação do capital; o desenvolvimento de meios de transporte cada vez mais eficientes; a criação de uma rede mundial de telecomunicações que transforma o planeta numa aldeia global; e as relações de interdependência econômica e ambiental, acompanhadas do surgimento de uma consciência ecológica internacional. Esses fenômenos sociais se refletem na idéia de que vivemos na “espaçonave Terra”; de que vagamos todos nessa imensa nave-mãe, e qualquer coisa que se faça em seu interior afetará a todos os passageiros.
A compressão do tempo-espaço inicia-se na Era Moderna, ganha impulso com a Revolução Industrial, e atinge um grau até então impensável nas últimas décadas. As mudanças nas concepções de tempo e espaço ocorreram lentamente a partir da decadência do feudalismo europeu, com suas estruturas cristalizadas e relativamente estáveis, quando as qualidades finitas do lugar – um território intrincado de interdependência, obrigação, vigilância e controle – eram acompanhadas de rotinas de vida cotidiana bastante estáveis e sedimentadas na tradição. O Iluminismo instaurou um projeto de vida social planejada e controlada, a fim de promover a igualdade social e o bem-estar de todos. Essa mentalidade racionalizadora do tempo e do espaço encontrou no mapa, no relógio e no calendário instrumentos particularmente úteis.
A partir de meados do séc. XIX a economia mundial toma o rumo de um globalismo ainda mais radical, marcado pela fase de aceleração e expansão do capitalismo, e alavancado por desenvolvimentos tecnológicos, como o surgimento de redes ferroviárias, jornais diários, comunicações por telégrafo, navegação a vapor e, mais adiante, o rádio e o automóvel. Já então, o “encolhimento” do mundo passa a criar desafios para a manutenção das identidades locais e do sentido de continuidade histórica. Tais mudanças parecem requerer uma maior plasticidade do eu diante das qualidades fragmentárias e polivalentes do espaço na sociedade contemporânea. Elas refletem-se na filosofia e na cultura da virada do século xx, com o surgimento de movimentos nas artes plásticas como o cubismo, o surrealismo e o futurismo, assim como, na música, com o dodecafonismo.

O encolhimento do mapa graças a inovações nos transportes que aniquilam o espaço por meio do tempo. Na figura, a progressão em que ocorre este encolhimento desde 1500, quando a locomoção era feita por barco a vela e carruagens, a uma média de 16 km/h, até o advento do avião a jato, em 1960, com velocidade de 1.100 km/h.

Referência: HARVEY, D. (1992) Condição pós-moderna. São Paulo: Edições Loyola.


29 novembro 2006

28 novembro 2006

Os vínculos de reconhecimento (III)

Continuação da série de artigos que venho publicando aqui (parte I, parte II), sobre a importância do reconhecimento do outro na construção da identidade.

Cultura local e cultura global: existe conflito?

Em tempos de globalização, tornam-se borradas e evanescentes as referências de tempo e espaço, próprias das sociedades tradicionais. De forma geral, as pessoas nasciam e morriam no mesmo lugar, permaneciam na mesma classe social, ocupavam tarefas e cargos dentro de uma comunidade que as conhecia e que servia de base para que cada um soubesse muito bem “quem era quem”. Hoje, os meios de comunicação e os meios de transporte tornam o mundo cada vez menor, e os lugares cada vez menos diferente dos demais. Além disso, o rompimento com as tradições culturais locais e o enfraquecimento do papel moderador da autoridade religiosa expõem a indivíduo ao desafio de manter um frágil equilíbrio entre o seu núcleo de identidade pessoal e as incontáveis alternativas de ser e estar num mundo onde tudo vale, tudo pode.

Como já foi dito na segunda parte deste artigo, a manutenção da identidade pessoal depende de um jogo entre duas forças opostas e complementares: a vontade de ser único e a vontade de fazer parte. Nas sociedades contemporâneas, a ênfase dos discursos vem recaindo progressivamente sobre a primeira parte da equação: ser único, ser individualista, ser exclusivo, ser original. Entretanto, ao mesmo tempo em a mídia impõe padrões cada vez uniformizantes de beleza, de moda, de consumo e de comportamento em geral, criam-se variações dos modelos, dissidências, e agrupamentos secundários por faixas etárias, por origens étnicas, ou por estilos de comportamento.

Além disso, existem mecanismos pelos quais as pessoas, e as sociedades locais, reagem às tendências globalizantes tanto da economia e da política, quanto da cultura. Afinal, não basta a ninguém se saber parte de um mundo único, ou seja, não é possível sentir-se “fazendo parte” apenas de uma grande sociedade humana, globalizada. Assim, as pessoas tendem a buscar sua identidade através de grupos menores e de segmentos sociais mais específicos. De fato, “globalidade” e “localidade” são dois extremos de um continuum, ou duas faces da mesma moeda. Tanto mais Florianópolis é invadida por imigrantes de outras partes do Brasil, em busca de melhor qualidade de vida, tanto mais a identidade de “manezinho da Ilha” e a cultura nativa são valorizadas.

É aí que entra a atual tendência ao neotribalismo e aos fundamentalismos religiosos e nacionalistas. O sociólogo Zymunt Bauman tem assinalado que a contemporaneidade é igualmente uma era de revalorização da comunidade e de um paradoxal apego às formas de filiação e pertencimento. Há uma reação diante do risco de fragmentação e homogeneização cultural. Mesmo em nosso meio existe o fenômeno das tribos urbanas, embora não tenha a magnitude dos grandes centros metropolitanos. Versões light do neotribalismo podem ser vistas, principalmente entre os adolescentes, na apropriação da moda e nas diferentes comunidades de interesses (os gls; os naturalistas, alternativos e ecológicos; os militantes políticos e engajados; os malhados, os surfistas, os desportistas de todo gênero; os funkeiros, os pagodeiros, ou a turma da mpb; os mais intelectualizados e os nerds, etc).

O processo de multiplicação de agrupamentos por interesses específicos, de comunidades e tribos urbanas, gera igualmente uma segmentação de mercado que, por sua vez, realimenta e perpetua o processo inicial. Surgem publicações cada vez mais específicas, dirigidas aos mais diferentes interesses; lojas de roupas e acessórios são cada vez mais direcionadas a segmentos específicos; bares, casas noturnas e locais de encontro se especializam. As pessoas são forçadas a encontrar a própria tribo e a consumirem aquilo que as identifica como membros de cada comunidade. Nas palavras de uma estudante universitária, “é terrível, porque quando não se quer pertencer a tribo nenhuma, ainda assim tu acabas sendo enquadrada em algum lugar, nem que seja porque um dia tu apareceste com uma roupa e alguém te chamou de alguma coisa, e assim ficou. Porque é necessário ser qualificado. Ninguém pode não ser simplesmente nada...”.

Em última instância, toda identidade é “grupal”. No entanto, o termo é utilizado geralmente para se referir aos aspectos mais evidentes das identificações com grupos ou comunidades. De fato, há um processo de dupla mão, no qual a comunidade reconhece o indivíduo como um dos seus, e o indivíduo reconhece os modelos fornecidos pela comunidade. Os membros de um grupo compartilham sistemas simbólicos e geralmente têm os mesmos tipos de experiências. Assim, as identificações grupais se constituem em estratégias de manutenção da segurança ontológica e de sobrevivência psíquica.

Num mundo marcado por intensas e profundas mudanças, as pessoas buscam e reforçam as identidades grupais de diferentes naturezas, inclusive aquelas criadas pelas novas tribos urbanas. Em todos os casos, é a busca por pertencimento e reconhecimento que está na raiz dos agrupamentos sociais.

27 novembro 2006

Grande Sertão: Veredas

Volto ao cinquentenário de Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, que foi notícia no Jornal Nacional de hoje. Postei aqui dois artigos originalmente publicados no Floripa Total (link ao lado) sobre este tema. Para quem não viu, aqui estão:

26 novembro 2006

A morte de Sócrates


Louis David, 1787. Óleo sobre tela, 130 x 196 cm, Metropolitan Museum of Art, New York
Ao lado de Poussin, Louis David é um dos mestres do classicismo francês do século XVIII que produziu grandes obras inspiradas em temas helênicos. Esta A morte de Sócrates é uma das mais conhecidas, e nela David transformou o que poderia ser apenas uma tocante cena de martírio num chamado à nobreza e ao auto-controle, mesmo em face da morte. Entre os discípulos que rodeiam Sócrates, Platão aparece, resignado e triste, de costas para o mestre, ao pé do leito.
Sócrates se opôs aos sofistas argumentando que existem parâmetros absolutos e transculturais de certo e errado, bom e mau. Pode ser considerado um dos fundadores da noção ocidental de sujeito, na medida que atribuiu à consciência individual a responsabilidade pelas opções éticas. Acreditou que o cosmos sustenta-se sobre a bondade, e que a pessoa boa não tem porque temer a morte. Abaixo, trecho do discurso que proferiu pouco antes de morrer (conforme o relato de Platão), após ter sido condenado à morte pelos cidadãos atenienses, sob a acusação de corromper a juventude. O método de execução foi incomum em seu tempo: tomar uma taça de cicuta.

Aqueles que acreditam que a morte seja algo ruim estão errados. Há boas razões para acreditarmos que a morte seja boa, e eis duas: ou a morte é um estado de nada, ou, como dizem, há uma mudança ou migração da alma deste para outro mundo. Se você supuser que não haja consciência, mas um sono como quem dorme sem ser incomodado por sonhos, a morte será um indizível benefício. Mas se a morte for jornada a outro lugar, e lá, como dizem, todos os mortos são bons, o que daria um homem para poder conversar com Hesíodo e Homero?... A hora de partir chegou, e seguiremos nossos caminhos – eu o da morte, vocês o da vida. Qual o melhor, apenas Deus sabe.


25 novembro 2006

Pensamento chinês



Ideograma: lógica, poesia, linguagem.


Haroldo de Campos (um dos expoentes da poesia concreta) organizou esse livro, editado pela EDUSP em 1994, que ajuda a desvendar alguns dos mistérios dos ideogramas e da forma de pensar dos chineses. É também dele a tradução deste ensaio que faz parte da coletânea, publicado originalmente em 1939, do qual faço aqui um resumo.

A TEORIA DO CONHECIMENTO DE UM FILÓSOFO CHINÊS

Chang Tung-Sun

I

Os problemas filosóficos do Ocidente não são exatamente os mesmo que ocupam o espírito dos filósofos chineses. Parece haver certa diferença entre os processos intelectuais chineses e os ocidentais. A teoria ocidental considerou o conhecimento como conhecimento universal da Humanidade, quando na realidade trata-se apenas de um tipo de conhecimento, existindo outros tipos em outras culturas.

Em resumo: é preciso tratar simultaneamente a teoria do conhecimento e a história cultural; não é apenas o pensamento social concreto que tem um fundamento social: as formas lógicas e as categorias teóricas também têm seus determinantes culturais; a diferença entre o pensamento ocidental e o oriental pode ser explicada a partir desse ponto de vista; e, a partir daí, pode-se compreender que a Filosofia ocidental é apenas uma forma particular de conhecimento característica da cultura ocidental e para uso dela.

II

Existe uma diferença entre o conhecimento perceptivo e o conceitual. O conhecimento conceitual é conhecimento interpretativo, e este é conhecimento teórico. A Ciência é uma síntese de dois tipos de conhecimento, sendo um a observação direta, e o outro a interpretação. Nenhum conhecimento pode dispensar seu conteúdo social, cuja emergência e existência só ocorrem no campo do conhecimento interpretativo.

III

Linguagem e pensamento são fundamentalmente inseparáveis. Todo pensamento, para articular-se, só o poderá fazer através da linguagem ou do símbolo. Se o pensamento se desenvolve com a linguagem e a linguagem é uma forma de comportamento social, então fica claro que, com exceção dos elementos experimentais, todo conhecimento é social.

IV

Com a gramática e a estrutura da frase surge a lógica. Os lógicos ocidentais consideram que a Lógica refere-se ao conjunto de regras do raciocínio humano. De fato, a Lógica aristotélica, que lhe deu origem, baseia-se evidentemente na gramática grega. O tipo de proposição “sujeito-predicado” não existe na Lógica chinesa. Por exemplo, não é possível escrever algo como “A se relaciona com B”. O que é possível é a seqüência de três caracteres, para indicar respectivamente “A”, “conexão”, e “B”.

V

A Lógica aristotélica está intimamente ligada ao verbo “ser”, de onde deriva uma “lei da identidade”. Nela, a substância é um simples derivado do sujeito e do verbo “ser”, que leva à idéia de “ente”. Um atributo deve ser atribuído a uma substância, de modo que a idéia de substância é absolutamente indispensável ao pensamento, assim como o sujeito é absolutamente indispensável à linguagem.

Na língua chinesa o sujeito não é essencial, e não existe nenhum verbo “ser” comparável à forma inglesa e das demais línguas indo-européias. Assim, o idioma chinês está repleto de frases com sujeito indefinido, como “havendo dedicação à benvolência, não há maldade”.

VI

O sistema chinês de lógica - se é que existe um - não está baseado na lei da identidade. Enquanto na lógica ocidetantal pensa-se em termos de "A e não-A", dando ênfase à exclusão, o pensamento chinês enfatiza a qualidade relacional entre acima e abaixo, bem e mal, alguma coisa e nada. Ele usa figuras de linguagem como "o uso inverso de uma palavra" e o "uso metafórico". Por exemplo, o conceito mais importante na China antiga referia-se a "céu" (t'ien), que tem como definição a "cabeça humana", ou tudo que fica acima da cabeça. Este é um método "indicativo".

No chinês , a lógica da exclusão dá lugar à "lógica de correlação" ou a uma "lógica da dualidade correlativa", que enfatiza o significado relacional entre "algo" e "nada", "cima" e "abaixo", etc. A explicação da palavra "vender", por exemplo, é dada por seu oposto "comprar". Por serem ideográficos, os caracteres enfatizam os signos, e o chinês interessa-se pelas inter-relações entre estes, sem se preocupar com a substância que lhes fica subjacente.

VII

A natureza ideográfica dos caracteres chineses influencia não somente a estrutura da linguagem, mas também o pensamento ou filosofia do povo. De acordo com o antigo pensamento chinês, primeiro vieram os signos e depois engendraram-se e desenvolveram-se as coisas (ao contrário da visão platônica). A característica do pensamento chinês é a atenção exclusiva às implicações correlacionais entre os diferentes signos, como yin e yang. Na China não há sequer a palavra substância.

VIII

Como a noção de substância se relaciona com a de causalidade, as Ciências ainda são determinadas, em sua maior parte, pelo conceito de causalidade. No pensamento ocidental, religião, Ciência, e materialismo são interdependentes. Compreende-se que com a identidade dever haver substância; com a substância, deve haver causalidade; e o átomo fica entre as duas. Na China, Céu e Deus não são pensados de maneira primordial. A união dos dois ideogramas tem o significado de Providência, não sendo uma entidade, tampouco uma substância. A lógica da correlação, a classificação não-exclusiva, a definição analógica têm, como fundo comum, o pensamento político, que é característico da cultura chinesa. [Este e os próximos tópicos necessitam uma leitura mais detalhada para sua melhor compreensão, sendo difícil resumí-lo em virtude da complexidade do tema.]

IX

É característico da mentalidade ocidental sempre se perguntar antes "o quê" é alguma coisa, enquanto a mentalidade chinesa dá ênfase ao "como". Enquanto o primeiro tipo de pensamento é mais apropriado para a passagem da religião à Ciência, o segundo só pode se desenvolver na esfera sociopolítica. Isto explica porque o pensamento chinês se descuida da Natureza, e volta-se mais aos assuntos Humanos. O pensamento chinês recorre mais à analogia do que a inferência. É típico disto a fórmula jen che jen jeh (algo como "Humanidade assim como homem"). Trata-se de uma "lógica de analogia", pouco apropriada para o pensamento científico, mas amplamente utilizada nas argumentações sociopolíticas.

X

Enquanto nas línguas ocidentais existem transformações gramaticais fonéticas, no chinês elas são ideográficas. Assim, a palavra inglesa sense pode assumir as seguintes formas: sense (senso, juízo), sensation (sensação), sensational (sensacional), sensible (sensato), sensibility (sensibilidade) [o autor menciona ao todo 14 palavras]. Em virtude do uso de flexões, casos, ou outras formas gramaticais, a "forma" constitui um elemento essencial para o pensamento do Ocidente. Os caracteres chineses, apesar de terem radicais, não tem raízes. Os radicais são utilizados apenas com finalidade classificatória; por exemplo, certas palavras pertencem ao domínio da água e outras ao domínio das plantas. Os ideogramas chineses não ficam sujeitos a transformações gramaticais; não há flexão, declinação nem conjugação.

XI

[O autor encerra o ensaio com sua proposta de uma teoria do conhecimento, e o seguinte comentário, que reproduzo na íntegra.] Se o leitor tiver tido a paciência de acompanhar toda a nossa análise, talvez lhe tenha parecido que o autor descambou para o ecletismo. Há, porém, ecletismo e ecletismo. Se o ecletismo se revelar útil, oferecendo uma visão mais sintética de todos os problemas tratados, não terão cabimento muitos pedidos de desculpas.


Pode interessar também:
The Topography Of Language

Calvin & Hobbes

by Bill Watterson

24 novembro 2006

Goiabas, etc

A revista Piauí continua mandando bem, neste segundo número. Um bom exemplo do seu humor inteligente é o ensaio final, desta vez por conta de SAULO TH. PEREIRA DE MELO ("sweet maker"). Na forma de uma carta de amor, ele nos ensina a fazer uma goiabada come il faut. Essa receita veio a calhar para mim, que estou vivendo uma fase, digamos, bem Romeu e Julieta. Como sou doido por goiabada (principalmente a legítima mineira), deixo também aqui uma dica culinária, bem prosaica, por sinal: o novo sorvete de goiaba com nata da Kibon é uma delícia! Se quiser torná-lo ainda melhor, pegue essa goiabada que você vai aprender a fazer (ou pode comprar uma pronta, se achar mais fácil), derreta-a misturando com um pouco de água em fogo brando, até fazer uma calda, e derrame-a sobre o sorvete. Ecco li, un bello "caldo e fredo"!
Transcrevo abaixo o trecho inicial do ensaio:

TRATADO GERAL DA GOIABADA

An essay concerning the making of a good goyabada

Perguntavas-me muitas vezes por que eu fazia uma goiabada tão gostosa — e pedias a receita. Eu dizia que, como Leibniz, eu gostava de ter prazer no prazer do ser amado: tu. “E a receita?” — eu eludia a questão: não há receita, há um “procedimento”. Ademais, querida, dona do meu coração, este procedimento é Alchímico (com ch é mais bacana…). Fazer uma boa goiabada é como fazer L’oeuvre en Noir — fazer ouro. Ou a Philosophical Stone, l’élixir de vie e a Universalmittel. Veja só a importância de uma boa goiabada. Aprendi o procedimento, escrito em linguagem hermética, no Necromicron, aquele livro maldito que nunca existiu e que o Lovecraft me emprestou e eu devolvi. Mandei por sedex, para ele, em Providence, antes de eu nascer e depois de ele morrer.

Então, por amor a ti e enfrentando todas as maldições, ameaças e feitiços da Kabbala — aí vai, mas tenho que perguntar, tal como O Coelho Branco, para o Rei (ou será a Rainha?): “Where shall I begin, please, your Majesty?” E o Rei (ou a Rainha), do alto de sua sabedoria real, disse “very gravely”: “Begin at the beginning [you ass] and go on till you come to the end: then stop.”

E assim, seguindo o mais sábio, ilustre, real e lógico conselho — começo pelo começo. E o começo da goiabada é a goiaba!

23 novembro 2006

Lexicon (3)

CIÚME
Reação normal (com variados graus de intensidade), traço de personalidade ou expressão de doença, o ciúme é marcado por nuances de dor, insegurança, rejeição, muitas vezes desejo e até planos de vingança, ainda que apenas no âmbito da fantasia. Etimologicamente, a palavra ciúme tem entre seus sinônimos o vacábulo zelos (no plural), originário da evolução fonética do latim vulgar zelúmem, o qual, por sua vez, veio do grego, zelosus, que deu origem a jealous (ciumento) e jealousy (ciúme), em inglês, e, com os mesmos sentidos, jaloux e jalousie, em francês. Origem idêntica é encontrada no italiano geloso e no espanhol celoso.
Zelo, no singular, é apresentado também com outro significado: cuidar, tomar conta para que algo ou alguém por quem se tem apreço não se perca ou seja roubado. Embora zeloso não seja o mesmo que ciumento, transmite a idéia de propriedade agregada à afeição, que entra na conceituação primeira de ciúme. Medo de perda e ansiedade dão o tom de aflição e sofrimento que acompanha o ciúme. Em alemão, a palavra Eifersucht (ciúme) faz alusão ao fogo, a queimar. Eifer remonta à raiz indogermânica ai=arder, e sucht é um termo antigo usado para designar doença, dependência. Eifersucht, portanto, é a doença que arde.
Fonte: viver mente&cérebro, nov 2006, p. 54.
Lexicon (2)