Perguntam-me se aprovo o projeto de lei do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) que altera a Lei de Drogas (Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006). A proposta visa mudar fundamentalmente dois aspectos da lei: o primeiro é prever a participação das Forças Armadas no combate ao tráfego nas fronteiras; o segundo trata das penas aplicadas aos usuários e introduz a possibilidade de internação compulsória para tratamento.
Quanto à mobilização das Forças Armadas contra o tráfego de drogas, principalmente nas fronteiras, são desnecessários maiores comentários. Que combatam também o tráfico de armas, o contrabando de cigarrros, a entrada de terroristas das FARC e de tudo o mais que não nos serve...
O segundo aspecto diz respeito ao que genericamente denomina-se de “porte” de drogas. A lei atual parece feita sob encomenda para tratar dos casos de usuários de maconha: no artigo 28, cuja redação é objeto de mudança pelo projeto apresentado, o porte fica definido os casos de "quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal" e "quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica". As penalidades previstas nestes casos, na atual lei, são: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Fica claro, na exposição de motivos, que a mudança da lei tem em mente principalmente os problemas gerados pela disseminação do uso do crack, com suas conseqüências devastadoras para o usuário, a família e a sociedade como um todo. Com fundamento nisto, o substitutivo do Senador Demóstenes propõe como pena para estas mesmas situações definidas no artigo 28 a detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, sendo que o juiz “com base em avaliação realizada por comissão técnica, substituirá a pena privativa de liberdade de que trata o art. 28 desta Lei por tratamento especializado. A tal comissão será formada por membros indicados pelo Conselho Municipal Antidrogas e será composta por três profissionais com experiência em dependência e efeitos das drogas, sendo ao menos um deles médico”.O segundo aspecto diz respeito ao que genericamente denomina-se de “porte” de drogas. A lei atual parece feita sob encomenda para tratar dos casos de usuários de maconha: no artigo 28, cuja redação é objeto de mudança pelo projeto apresentado, o porte fica definido os casos de "quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal" e "quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica". As penalidades previstas nestes casos, na atual lei, são: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Em sua justificação, o projeto diz que “para corrigir o erro” cometido na versão anterior, “volta a punição ao usuário, não para transformar em tema unicamente de segurança pública uma questão que também é de saúde pública. Familiares, educadores e o próprio Poder Judiciário ficaram de pés e mãos atados para internar o usuário. Se ele quiser se tratar, arruma-se uma clínica; se recusar o tratamento, nada se pode fazer além de assistir a autodestruição.” A ambivalência entre as intenções de punir ou tratar, aparece também quando o autor reconhece que “a outra parte, que trata da popularmente denominada ‘internação compulsória’, resgata a possibilidade de prisão para o usuário de drogas, pois a despenalização foi uma experiência ruim, servindo unicamente para potencializar o sofrimento dos próprios viciados e seus familiares” (os grifos são meus).
Ora, confunde-se aqui internação compulsória com prisão, quando o próprio autor cita, apenas algumas linhas depois, a opinião do médico Léo de Souza Machado, especialista da Associação Brasileira de Psiquiatria e membro internacional da Associação Americana de Psiquiatria: “O termo ‘compulsório’ deve estar sempre associado ao termo ‘tratamento médico’ e não a internação, visto que a internação compulsória é carregada de estigma e sofre críticas ideológicas de toda ordem. [...] A melhor maneira de garantir a assistência integral aos dependentes químicos é vincular a substituição da pena privativa de liberdade ao tratamento, que será melhor estabelecido se a câmara técnica for composta por médicos especialistas em psiquiatria, que estabelecerão de maneira individualizada o projeto terapêutico para os indivíduos que forem considerados pelo Judiciário elegíveis para substituição da pena por tratamento especializado”.
O problema do Brasil não é a falta de leis, mas a falta de Estado onde ele mais deveria estar. Neste caso, garantindo o combate articulado ao tráfico de drogas, por um lado (inclusive com medidas diplomáticas duras junto a países “irmãos” que o facilitam), e a garantida de serviços de saúde em quantidade e qualidade necessárias. A falta centros de tratamento e de leitos psiquiátricos em geral, e para tratamento de dependentes químicos em particular, isto sim, merece uma grande mobilização da sociedade e do Congresso Nacional.
Se o objetivo da lei é dar destino e tratamento aos dependentes graves de crack, por que não fazer uma lei explicitamente com este fim. Não faz mais sentido usar a mesma norma jurídica para lidar com situações tão dispares quanto a de um jovem adolescente que possui um baseado em casa e a de outro que se encontra nas malhas da destruição promovida pela dependência ao crack.
3 comentários:
como aluno de medicina, posso ver em emergencias, como por exemplo a do hospital regional, onde os jovens entram devastados pelo efeito da droga e apos receberem atendimento medico, voltam para as ruas desesperados atras do crack. precisamos de novas leis e de pessoas capazes para organizar nosso país.
Com certeza o que mais falta no Brasil é um estado que execute as leis sistematicamente e de forma eficientemente democrática.
Há que se entender a diferença entre tratamento compulsório e internamento compulsório, bem como prisão, encarceramento e outras PENAS por crimes comuns.
O primeiro cabe perfeitamente como intervenção alternativa aos delitos,transgressões e crimes leves(?) cometidos em função do uso/abuso de SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS(spa),entre elas álcool, drogas ilícitas e psicofármacos e entre outros transtornos psiquiátricos que causam alterações comportamentais de risco.São tratamentos e não pena/punição. E tratamento compulsório pode ser desde AMBULATORIAL(em suas modalidades extensivas ou intensivas)até tratamento em REGIME DE INTERNAMENTO, nos casos que tenham essa INDICAÇÃO MÉDICA.
O INTERNAMENTO COMPULSÓRIO depende de complexas circunstâncias momentâneas,tal como risco grave de auto e heteroagressões, riscos de outras transgressões muito graves e prejuízos SEVEROS ao próprio indivíduo e/ou sócio-familiares,quadro clínico médico-psiquiátrico subjacente muito grave, deficiências graves na rede de apoio sócio-familiar,entre outras condições de risco.São circunstâncias que já tem previsão e regulamentação técnica, ética e legal em nosso país,é preciso apenas que sejam aplicadas e fiscalizadas.
Outra questão importante e fundamental é se entender a diferença entre prisão/cadeia para criminosos comuns e custódia ou tratamento/internamento compulsório para portadores de transtornos mentais suficientemente graves e/ou que alteram a capacidade de livre arbítrio da pessoa, como é o caso das dependências químicas e outros comportamentos aditivos(compulsão por jogo, cleptomania,etc).
No caso dos dependendes químicos o internamento(que é uma indicação médica!E tão somente médica!), a função do internamento, entre outras, é de protejê-los da sociedade que o expõe ao consumo, já que por conta de uma doença que enfraquece ou destrói o livre arbítrio associado às atitudes desse consumo; "Dependência química é a perda da liberdade de escolha entre usar e não usar a droga(spa)" Carol Sonenreich.
Muito diferente da cadeia/prisão no sentido tradicional ,em que o criminoso É QUE É AMEAÇADOR para a sociedade e esta precisa de proteção na forma de cerceamento da liberdade física desse elemento perigoso...E CONFINA-O NUM LUGAR QUE SUPOSTAMENTE DEVERIA SER SEGURO PARA QUE NÃO FUJA E QUE PODERIA SER "RESSOCIALIZADO".
Outra coisa importante, é ter claro que esse fenômeno do crack, é muito mais um fenômeno que reflete nossos problemas sócio-econômicos e políticos, e muito menos um problema individual, ou de certas categorias sociais.Não é preciso ser um antropólogo, um sociólogo ou um psiquiatra social, para identificar que as causas desse fenômenos estão na histórica negligência e desprezo de nossos políticos e elites pela educação e distribuição de renda entre nossos cidadãos...
Por fim dentro de problemas semelhantes podemos ter grandes diferenças, uma coisa é um crime hediondo, e que tipo de pena iremos aplicar, outra coisa é um jovem que viole uma lei municipal como por exemplo fumar em ambientes em que isso é proibido, mesmo que ele seja reincidente ,terá que ter um tratamento diferenciado do que um sujeito que por exemplo torturou , matou, aliciou dezenas de criança através do tráfico de drogas.
Dentre dessa idéia de uma hierarquia de procedimentos médicos tratamos diferentes tipos de neoplasias, com diferentes tipos de intervenções ,desde as mais leves como uma simples cirurgia até cirurgia, seguida de radioterapia,quimioterapia,etc.
Assim também nos campo da saúde mental, uma coisa é a insalubridade de "um baseado" por semana para um jovem usuário disso outra é a insalubridade de uma série de "cachimbadas" de crack por dia, por um jovem usuário. Parece que aqui também teremos que ter uma hierarquia de intervenções ,psicossociais e médico-psiquiátricas(se for o caso!)
Valeu a aula, Valter!
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