Em História do Pranto, o escritor argentino Alan Pauls, o mesmo de O Passado, revela uma capacidade rara de desenhar cenários minimalistas que abrigam personagens complexos. Seu texto está repleto de construções de subjetividades raras, de tipos humanos que não se encontram nas esquinas, e de estados de espírito muito particulares. Cada parágrafo é uma longa digressão de livre-associações de idéias que exigem, às vezes, uma concentração descomunal e que se volte ao seu início. Mas há também os sentimentos universais que fazem de todos nós seres parecidos, e permitem que nos encontremos nos outros, e nas longas frases dos longos parágrafos desse livro, cujo protagonista é uma criança – depois jovem adulto – cuja principal característica “é a sensibilidade. Escutar, chorar, às vezes, e, muito de vez em quando, também falar. Falar, quando acontece, é o estágio superior”.
Aqui, Pauls descreve o processo de cicatrização das feridas psíquicas. O apagamento gradual do sofrimento, o seu esmaecimento, sem no entanto que desapareça totalmente, já que estarão para sempre presentes nos porões da alma, e podem a qualquer momento ser despertadas.
Mas com os anos, expulsa das coordenadas de tempo e de lugar em que se passou, a cena perde vitalidade, desidrata-se e contrai-se, como o órgão extirpado resseca se não é logo acolhido pelo tecido pletórico de sangue e nervos de um novo organismo, até transformar-se numa moléstia ínfima, que quase não ocupa espaço nem é preciso dissipar, tanto se enfraqueceu sua energia hostil, ainda que na primeira oportunidade, assim que entra na órbita de uma ofuscação maior ou mais atual, convocado por um desses signos que, de imprevisto, sem propósito, fazem com que o presente mais banal rime com uma porção de passado atroz...
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